Sofrimento e consagração: os bastidores da preparação de Ramon Dino até o título do Mr. Olympia

Depois de mostrar as origens no Acre e o início da trajetória de Ramon Dino no fisiculturismo, o Esporte Espetacular exibiu neste domingo (9) os bastidores do histórico título do Mr. Olympia, no segundo e último episódio da série especial sobre o atleta. A produção mostra detalhes da preparação e apresenta imagens inéditas da competição em Las Vegas.

Após o desempenho abaixo do esperado em 2024, Ramon Dino mudou a liderança da sua comissão técnica no início de 2025. Ele rompeu a parceria com Filipe “Faixa Preta” e passou a ter o renomado Fabrício Pacholok como treinador. Além disso, trouxe outro profissional para ajudar em sua preparação: o coach de poses André Pajé.

A preparação

O episódio se inicia em São Caetano do Sul (SP), a nove semanas antes do Mr. Olympia 2025, já na fase de pré-contest. É um momento do fisiculturismo em que os atletas começam a “lapidar” o corpo e, por isso, reduzem consideravelmente a ingestão alimentar a cada semana até chegar na competição.

– É a hora que ele vai começar a baixar peso. A cada semana, a restrição calórica dele vai baixando um pouco. É o momento que o atleta tem menos energia. E eu tenho que tirar dele o máximo dos treinos: tentar manter as cargas e o número de repetições, para ele conseguir secar e manter o máximo possível da massa muscular dele – destacou Pacholok.

A dificuldade foi compartilhada pela esposa de Dino, Vitória Viana. Ela contou que esse é um dos momentos mais complicados da preparação porque o humor do atleta é alterado, com um modo mais silencioso e focado. A rotina até competir é marcada por um ciclo que se resume a treino, descanso, alimentação e exercício aeróbico.

Depois desse período sofrido em São Caetano, Dino viajou para os Estados Unidos cerca de um mês antes do Mr. Olympia, que aconteceu em outubro deste ano. Ele teve um período de avaliação com árbitros internacionais, que passaram feedbacks sobre seu último desempenho, e depois ficou imerso em um período de treinos em Tampa, na Flórida.

– Cada preparação é um físico diferente que você mostra no palco. Vamos supor que você iniciou agora. Você mostrou todos esses exercícios. Esse exercício eu fiz, mas os jurados falaram que precisa melhorar peito ou perna. Aí conforme a gente, vai nos outros campeonatos, vamos trazendo melhorias onde faltava – disse Dino.

O atleta, sua equipe e a esposa desembarcaram em Las Vegas, cidade que recebe o Mr. Olympia, uma semana antes do evento. Considerado o torneio mais importante do fisiculturismo, o Olympia ganhou fama mundial graças a Arnold Schwarzenegger, heptacampeão entre as décadas de 1970 e 1980.

– Quando a gente olha para o histórico do Mr. Olympia, nós tivemos grandes campeões, mas o maior de todos foi o Arnold Schwarzenegger. O Mr. Olympia foi uma parte muito grande da história do Arnold antes dele se tornar ator. É o maior campeonato do mundo, é a Copa do Mundo do fisiculturismo, onde grandes atletas se consagram – comentou Terrick El Guindy, único árbitro brasileiro do Mr. Olympia.

Tensão na pesagem

A categoria de Dino é a Classic Physique, que busca simetria, volume muscular, definição e proporção nos atletas. Essa divisão tem um limite de peso baseado na altura de cada atleta, e isto foi pauta de muito debate no mundo do fisiculturismo nos dias que antederam o Mr. Olympia 2025.

A organização do evento solicitou, de última hora, uma nova medição de altura de todos os atletas antes da competição. A princípio, seria realizada apenas a pesagem, sendo consideradas as alturas que os atletas haviam apresentado em competições anteriores.

Isso não foi motivo de preocupação para Ramon Dino, que mede 1,81m e deveria pesar 103kg. Entretanto, seu principal rival, havia a expectativa de que seu principal rival, o alemão Mike Sommerfeld, não atingisse a altura que havia indicado no Mr. Olympia 2024, quando foi vice-campeão. Isso beneficiaria o brasileiro, já que, com altura inferior, Mike precisaria reduzir o peso e, consequentemente, o volume corporal.

– Nós queremos fazer a pesagem e verificar se todo mundo está correto, baseado nesses critérios. Se algum atleta não conseguir bater o peso, infelizmente ele não vai poder competir. E existem grandes controvérsias que talvez alguns atletas vão sofrer pra bater esse peso – indicou Terrick.

Apesar de Dino ter se enquadrado nos padrões da categoria em diversas medições realizadas pela sua equipe, ainda assim a pesagem foi um momento tenso. Muitos atletas tiveram reajustes de altura e, por isso, não conseguiram bater o peso, o que começou a preocupar a esposa Vit.

– Claro que a gente estava tranquilo, porque a gente já bem sabe que a altura dele é 1,81m, mas quando eu comecei a ver aquela galera multidão voltando, que acho que foram uns 10 que não bateram peso, eu comecei a ficar preocupada. Mas depois que eu vi que ele já estava com a medalha, eu falei “ufa”, mas foi tenso – relatou ela.

Dino bateu o peso como era esperado. Já Mike Sommerfeld não conseguiu bater o 1,75m que havia declarado na última edição do Mr. Olympia. Ele anotou dois centímetros a menos e, apesar disso, conseguiu bater o peso – ele havia feito um trabalho para queimar calorias nos dias anteriores.

A competição

Passada a tensão da pesagem, chegou a hora de se preparar para subir no palco. Um dia antes da competição, Dino passou a primeira mão de tinta em seu corpo. Durante a pintura, o episódio mostra um depoimento marcante do estadunidense Derek Lunsford, parceiro de treinos de Dino, que também é treinado por Fabrício Pacholok e que viria a ganhar a categoria Open.

– Ele está incrível. Muito trabalho duro, muita dedicação, muito sacrifício. As pessoas não percebem o quanto isso exige. É um esporte muito egoísta o que fazemos, e nós temos famílias, esposas, filhos, e nossas famílias também se sacrificam junto com a gente. Muitas vezes ele perde momentos em família, com amigos e pessoas queridas, e tudo resulta nisso. O trabalho duro está aparecendo. Eu estou muito animado para assistir as prévias do Ramon. Vai ser incrível – falou Derek.

A competição do fisiculturismo é dividida em duas partes: as prévias, realizadas pela manhã, e a final, disputada na noite do mesmo dia. Dino revelou seu sentimento antes de subir ao palco pela primeira vez, no Las Vegas Convention Center:

– Estava pensando em não errar na hora da coreografia. E o resto já estava tudo certo. Fui lá, aqueci tranquilo, de boas.

O principal momento da competição é quando os árbitros começam a comparar os atletas. Todos são perfilados no palco e os árbitros começa a comparar os perfis de cada um.

– A gente coloca esses oito atletas na linha, e aí a gente começa a mover os atletas baseado na qualidade deles. Quando o público percebe que o atleta favorito deles está indo para o centro, eles sabem que isso é um sinal que ele é um dos favoritos a ganhar o campeonato. Então, cada mudança que os árbitros fazem é um sinal da sua possível qualificação para as finais – falou Terrick.

Ramon terminou as prévias no centro do palco, o que deixou sua equipe e toda a torcida brasileira empolgada, algo que deixou o atleta ainda mais confiante. Pacholok, inclusive, afirmou que Dino havia ganhado as prévias e precisaria manter o mesmo físico para confirmar o título de noite:

– Eu preciso tirar a emoção do lado pra fazer um julgamento justo. Pequenos detalhes, agora a gente precisa manter esse físico. Não pode deixar que esse físico regredir, tem que segurar esse físico até a noite. Conhecendo ele, eu sei que ele vai melhorando ao longo do dia depois desse confronto.

Após uma tarde de descanso, Dino voltou com tudo para as finais, mas teve que esperar quase três horas desde o início da sessão até chegar o momento da sua categoria. Depois de mais uma bela perfomance, o brasileiro foi escolhido entre os dois melhores do campeonato, ao lado de Mike Sommerfeld. No anúncio do vencedor, uma longa espera que deixou todos ansios.

– Eu acho que eu preciso passar fome do que passar essa tensão. Ô, meu Deus do céu. É muito ruim. Parece um milênio ali. Fala, caramba! – lembrou Dino.

Depois do título, veio a comemoração:

– Fiquei agradecendo muito a Deus, porque eu sei que Ele me escutou e Ele que fez tudo aquilo. Pensei nos meus pais e tudo, pensei no Brasil já. Muita coisa. Mas acima de tudo, gratidão. Toda dificuldade e tudo. Mas principalmente, toda a construção. A persistência que a gente teve – contou.

– Não é só o vencer. É tudo aquilo que ele fez pelo esporte. Como ele mostrou o esporte, como ele foi um menino que saiu do Acre. E não é só do Acre, é da periferia do Acre, sem recurso nenhum. E olha o que ele está fazendo. Muita gente tem desculpa, né? Ele tinha tudo pra desistir – falou Geovanni Sampaio, um de seus primeiros treinadores, ainda da época do Acre.

Alerta sobre o uso de anabolizantes

O episódio da série também aborda um assunto de saúde importante. O fisiculturismo é uma modalidade que não há controle antidoping. Por isso, o uso de esteroides anabolizantes é algo comum entre os atletas.

– Existem federações que são de fisiculturismo natural, que vêm crescendo bastante, que de fato têm controle antidoping. Mas no fisiculturismo, os árbitros não se preocupam como que o atleta chegou lá, eles julgam como o atleta está no momento – destacou André Pajé.

O Conselho Federal de Medicina (CFM) proíbe a prescrição médica de esteroides androgênicos e anabolizantes para fins estéticos, ganho de massa muscular e melhora de desempenho esportivo. O médico do esporte Mateus Freitas Teixeira alerta sobre os problemas de saúde que o uso dessas substâncias pode gerar.

– As pessoas usam pequenos ciclos para ficar bem, do ponto de vista de corpo, para se sentirem bem, para performar melhor. Só que a partir do momento que você muda o eixo hormonal, tudo muda. E você sofre a depender do ciclo. Aumenta a possibilidade de AVC, de infarto, de trombose venenosa profunda – falou o médico.

Com um poder de influência muito grande por ser ídolo de uma geração e o maior nome do fisiculturismo brasileiro, Ramon Dino afirmou que não gosta de utilizar os anabolizantes e não incentiva as pessoas a usarem no dia a dia.

– Se pudesse escolher não fazer o uso, eu faria isso, porque é uma coisa que não gosto particularmente. E o resultado vem principalmente da base da alimentação, do descanso e da suplementação. Esse negócio do hormônio é uma coisa mínima, que todo mundo acha que vai fazer a grande diferença e aí que está o erro – finalizou Dino.

Fonte: ge globo

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